terça-feira, 21 de abril de 2009

A gota d'agua


Acordei repentinamente. Olhei em volta do meu quarto e fiquei aliviado ao saber que toda aquela experiência horripilante tinha sido apenas um sonho ruim.
Me levantei da cama muito dolorido. Meu colega de quarto, Arthur já tinha saído para tomar o café da manhã. Então depois de passar uma água no rosto, me dirigi ao refeitório.
Logo que me acomodei à mesa, Arthur veio me provocar. Sentou-se do meu lado e pegou uma torrada da minha bandeija.
- Como passou a noite fernandinho? – Zombou Arthur.
- Eu não quero confusão! Se já não bastasse ser seu colega de quarto, ainda tenho que aturar essas brincadeirinhas. – Irritado, levantei-me e puxei a torrada da mão de Arthur antes que ele pudesse colocá-la na boca. Fui sentar-me em outra mesa sozinho.
Por incrível que pareça, nós dois somos muito parecidos. Temos os mesmos objetivos e telvez fosse por isso que somos tão competitivos e acabamos por nos desentender.
Mas eu tinha preocupações mais importantes do que confrontar Arthur.
Voltei meus pensamentos para Mariana, a filha do zelador do internato.
Apalpei meu bolso esquerdo, que continha as mais valiosas anotações da escola.
“Venho trabalhando nesse poema faz semanas e será a chave do coração de Mariana”, pensei.
Já era noite e era hora de todos se recolherem para seus dormitórios. Ao chegar no quarto, vi que Arthur já estava na cama coberto até a cabeça. O que era muito estranho, porque ele não costuma dormir tão cedo. Pensei que ele poderia estar doente.
Eu saí sorrateiramente pela janela para não acordar Arthur de quarto e não chamar atenção de nenhum dos bedéis. Desci pela calha, e fui até o quarto de Mariana, que fica nos fundos da escola, na dependência dos empregados.
Toc, Toc, Toc
- Quem é? – Sussurou uma voz meio assustada.
- Sou eu! Fernando Augusto! – Respondi.
Percebi uma certa agitação dentro do quarto, talvez fosse um sinal de que ela estivesse nervosa com a minha visita, que talvez ela realmente gostasse de mim.
Olhei por trás dos ombros apreensivo, porque se alguém me encontrasse aqui, eu estaria em apuros.
Quando ouvi a porta destrancar, rapidamente ajeitei meu cabelo.
Mariana abriu a porta apenas o suficiente para mostrar seu rosto.
- Fernando, eu estou meio ocupada agora...
- Não posso esperar mais – Interrompi – Se eu não falar com você agora, talvez eu não tenha coragem para falar depois.
Puz a mão no bolso para retirar meu poema, mas ouvi um ruído vindo de dentro do quarto.
“Ora, Mariana não tem colegas de quarto”, pensei.
Desconfiado dei um empurrão na porta que Mariana segurava e vi Arthur sentado ao pé da cama do meu único e verdadeiro amor.
- Fernando... Espere... – Suplicou Mariana.
Sem dizer uma palavra, enxuguei uma única lágrima que escorreu dos meus olhos e corri o mais depressa possível sem olhar para tráz.
Estava determinado a me vingar. Toda a paixão que residia no meu peito fora substituída por ódio. E como era meu ódio por Arthur Virgolino. E como eu poderia continuar a desejar uma garota que já esteve nos braços de tal infeliz?
Cheguei no meu quarto e joguei minha declaração de amor sobre a mesa. Um lápis rolou e caiu no chão.
Puxei o cobertor que cobria as almofadas na cama de arthur.
Toda noite antes de dormir, Arthur beijava uma foto de sua mãe. Se meu maior sonho foi destruído, eu destruirei suas mais importantes lembranças.
À procura da bendita foto, revirei o quarto todo. As encontrei dentro de uma caixinha de madeira escondidas em seu armário. Eu o aguardava ansiosamente e quando Arthur finalmente chegou no nosso quarto, se surpreendeu ao me ver sentado sobre sua cama. Os raios da Lua iluminavam seu rosto petrificado, e o meu isqueiro iluminava a foto de sua querida mãe.
- Não a queime! Implorou.
Eu me levantei.
- Onde está toda a sua valentia agora?
- Desculpe pelas brincadeiras que eu fiz com você, eu juro que paro! Mas não a queime!
- Você roubou a minha namorada! Você quer competir em qualquer coisa que eu faço! Destruiu meus sonhos!
- Como assim? Se acalme!
Pude ver claramente que a expressão de Arthur mudou. Não apenas sua expressão, mas seu rosto também. Ele tinha assumido a minha forma!
Os angustiantes sentimentos que vivi em meu pesadelo noite passada, pesaram sobre meus ombros. Eu perdi o equilíbrio. Deixei cair no chão as fotos e o meu isqueiro. Tentei me apoiar sobre a mesa.
Olhei novamente para Arthur, que agora me desafiava com um olhar ameaçador. O quarto começou a girar ao meu redor. Eu caí de joelhos e pensava se tudo isso poderia não passar de uma alucinação.
Arthur se aproximava sussurrando:
- As fotos da minha mãe... - Então peguei um lápis do chão e numa última investida desesperada contra meu inimigo perdi a consciência.
Despertei atordoado sobre uma maca, com os braços e pernas presos.
Uma lâmpada muito forte ofuscava meu olho, pois um deles estava tapado.
- Aonde eu estou? – Perguntei.
- Parece que ele está recobrando a consciência. – Comentavam vozes distantes.
Um dos homem se pôs em frente à forte luz.
- Arthur, eu sou o doutor Octávio Cirqueira. Devo lhe informar...
- Arthur? Meu nome é Fernando, Fernando Augusto!
- Devo lhe informar – O homem continuou - Que conseguimos executar a cirurgia sem maiores danos.
- Como assim?
- Não existe nenhum Fenando! Você se auto flagelou perdendo a visão do olho esquerdo. Por sorte, o lápis não ultrapassou a cavidade ocular.
- Espere! Deve ser um engano! Isso é bobagem!
- Vamos encaminlhá-lo à uma clínica psiquiátrica depois de sua recuperação.
- Deve ser um engano! Eu não sou Arthur!
O doutor ignorou meus
gritos e foi embora junto com as outras pessoas, deixando-me sozinho, naquela fria e assustadora sala.
Erik Barros