domingo, 2 de setembro de 2012

Lisergia



Tinha na memória a imagem meio borrada de um homem, mas não conseguia lembrar quem era. Me sentia mal. Porque mesmo não sabendo de quem se tratava, aquela figura tinha grande importância para mim. Ainda me sentia ligado à ela.
Eu já não lembrava o que era pai, mãe, escola. O vertical se confundia com o horizonte e vice-versa. Tudo não passava de um grande nada. Sentia um vazio no peito ao me confrontar com certas questões, aquelas que não tem resposta. "O que estamos fazendo aqui?" "Qual é o sentido disso tudo?" Perguntei repetidas vezes à todos que estavam do meu lado, mas ninguém soube me responder.
Fiquei desesperado, com medo de ficar daquele jeito para sempre. Mas na realidade nem lembrava mais de como era antes. Sentia uma certa culpa, será que eu estava fazendo algo de errado?
Não sabia definir o ser humano, diferenciar gêneros. Pra mim tudo não passava de energia. Feixes de luz em movimento. Ou aquilo tudo estava muito certo ou muito errado...
Pouco-a-pouco eu fui me deparando com a existência de outros pequenos seres: as formigas, as joaninhas e as aranhas, verdadeiras artistas que construíam aquelas maravilhosas teias em 3D. Tudo perfeitamente alinhado e com um propósito. Me dei conta da relação entre os seres vivos, a cadeia alimentar e o ecossistema. Pensei, "nosso lugar é aqui, lado a lado dos insetos".
Depois de ter desaprendido tudo, eu estava vendo o mundo com outros olhos e como se fosse a primeira vez ia relembrando das coisas. Nem parecia que eu já tinha vivido assim algum dia.
Voltava pela mesma estrada de terra que passei na madrugada anterior, só que antes tinha tanta neblina que foi realmente difícil não se perder pelo caminho. Agora, com um sol escaldante de meio dia sobre a cabeça, eu e meu amigo Purush caminhávamos balançando o polegar pedindo carona para os carros que passavam. Não demorou muito e um carro parou do nosso lado levantando muita poeira. O motorista era um homem cabeludo de óculos escuros. Nós entramos no carro e continuamos seguindos pela estradinha.
Seu nome era Kranti, nos apresentamos e ele disse que estava indo para cidade também e podia nos deixar na rodoviária.
Durante a viagem o tal Kranti foi falando e falando, mas eu não conseguia entender nada, ainda estava meio atordoado, só concordava e balançava a cabeça enquanto olhava pela janela. Eu tirei do bolso um aparelho tecnológico, bonito. Demorei um pouco para perceber que era apenas o meu celular.
Estávamos subindo um morro em direção à Brasília por um caminho que eu nunca tinha ido. Quando alcançamos o topo, foi um choque. Mais parecia uma colônia de bactérias, mas era lindo! Essa visão me fez lembrar da vida em sociedade, que de fato a vida continua. No dia seguinte eu tinha aula e ainda teria que dar explicações para os meus pais por chegar tão tarde em casa.

Erik Schnabel